Os roteiros do Tarantino são muito conhecidos pelos diálogos (ás vezes gigantes) que ele cria com parábolas, associações, viagens ácidas e por aí vai...
Quem assistiu a Cães de Aluguel e não se lembra da “explicação” do autor sobre a música da Madonna “Like a Virgin”?
Mas foi em Kill Bill Vol. 2 que um destes diálogos me chamou mais a atenção, o discurso de Bill mostrando a Beatrix Kiddo quem realmente ela era, que sua essência sempre seria a de uma assassina e não de uma mãe dedicada, esposa - dona de casa; um enorme monólogo Tarantinesco explicando como o Super Homem vê o ser humano.
Após atingir a “noiva” com um dardo com o “soro da verdade indiscutível” ele solta o verbo "Superman: alter-ego Clark Kent":
Como você já sabe, eu sou um amante de revistas em quadrinho.
Especialmente as que são sobre super-heróis, acho fascinante toda a mitologia que cerca os super-heróis.
Pegue o meu super-herói favorito: O Super-Homem.
Não é um gibi excepcional, não é tão bem desenhado, mas a mitologia...
A mitologia não é só ótima, como é única.
(...) agora, o principal na mitologia de um super-herói é que de um lado está o super-herói e do outro está o seu alter-ego.
O Batman na verdade é o Bruce Wayne, o Homem-Aranha na verdade é o Peter Parker. Quando ele acorda pela manhã, ele é Peter Parker; ele precisa vestir um uniforme para se tornar o Homem-Aranha.
E é nessa característica que o Super-Homem é único.
O Super-Homem não se transformou em Super-Homem, ele nasceu sendo o Super-Homem.
Quando o Super-Homem acorda pela manhã, ele é o Super-Homem, o seu alter-ego
é o Clark Kent. O seu uniforme com o "S" vermelho é a manta que ele estava usando quando os Kent o acharam. Aquela é a sua roupa!
O que o Kent usa, os óculos, seus trajes de homem de negócios, esse é o disfarce.
Esse é o disfarce que o Super-Homem usa para se misturar com a gente.
Clark Kent é como o Super-Homem nos vê.
E quais são as características do Clark Kent?
Ele é fraco, é inseguro de si mesmo, é um covarde.
Clark Kent é a crítica que o Super-Homem faz de toda a raça humana.
E então entra sua analogia:
Como Beatrix Kiddo e a Sra. Tommy Plimpton.
Enfim, chegamos ao ponto.
Você teria usado o disfarce de Arlene Plimpton, mas você nasceu sendo Beatrix Kiddo.
E a cada manhã que você acordaria, você ainda seria Beatrix Kiddo.
(...) Uma assassina por natureza, você sempre foi e você sempre será.
com um pouco de rancor...
Se mudando para El Paso, trabalhando em uma loja de discos usados, indo ao cinema com o Tommy, juntando cupons
Essa é você tentando se disfarçar como uma abelha operária, é você tentando se misturar com a colméia.
Mas você não é uma abelha operária. Você é uma abelha assassina.
E não importa quantas cervejas você tomaria, ou quanto churrasco você comeria, ou o quanto o seu traseiro engordaria nada no mundo mudaria isso.
E o tapão final:
Não me entenda mal...
Eu acho que você teria sido uma mãe maravilhosa.
Mas você é uma assassina!
Lá no fundo, este diálogo me deixa triste... pensativa.
A visão de Tarantino sobre o ser humano me faz meditar sobre a minha. Ainda não tenho certeza sobre o que eu vejo... não sei se gosto disto!
(tradução do diálogo retirada da legenda do filme - Screenshot do filme do Yakaboo)